Produtores familiares de Porto de Moz apresentam documento compropostas para melhorar a criação de bubalinos a instituições de pesquisa, fomento e gestora da Resex Verde para Sempre, durante seminário realizado no dia 02 de outubro de 2012, na comunidade Cuieira, Rio Uiui, município de Porto de Moz. Leia o documento na íntegra.
quinta-feira, 11 de outubro de 2012
Os desafios da produção familiar rural em Porto de Moz - o caso dos pequenos criadores de búfalos
Produtores familiares de Porto de Moz apresentam documento compropostas para melhorar a criação de bubalinos a instituições de pesquisa, fomento e gestora da Resex Verde para Sempre, durante seminário realizado no dia 02 de outubro de 2012, na comunidade Cuieira, Rio Uiui, município de Porto de Moz. Leia o documento na íntegra.
terça-feira, 18 de setembro de 2012
A Amazônia e a importância da governança local
A gestão dos recursos naturais da Amazônia por comunidades tradicionais, colonos e assentados pode contribuir para o desenvolvimento rural sustentável. Contudo, o marco legal e institucional é caracterizado pela definição externa de pacotes técnico-gerenciais que dificultam o reconhecimento e apoio às iniciativas locais. Considerando o potencial das iniciativas locais, é necessário explorar as possibilidades de promoção de sistemas de governança desenvolvidos pela próprias comunidades como alternativa para o uso de recursos naturais. Iniciativas desenvolvidas pelos próprios produtores têm melhor potencial de adoção e manutenção por terem sido construídas com base em seus interesses e capacidades.
Criação de Búfalo Ameaçada na Verde Para Sempre
Durante mais de meio século, famílias ribeirinhas de Porto de Moz iniciaram e aprimoraram sistemas de manejo de criação de bubalinos nos campos naturais de várzeas entre os Rios Amazonas e Xingu. A capacidade de adaptação dos animais, aliada a inteligência e criatividade dos ribeirinhos na construção de marombas para o período das cheias, cercas para o manejo, transporte dos animais de uma área para outra em pequenas embarcações ou a nado fizeram com que a maioria das famílias tivesse sua renda ampliada com a produção do delicioso queijo de búfalo e a venda de animais para abate.
No entanto, a partir de 1989, com o nível das cheias cada vez maior, os criadores passaram a sofrer perdas acentuadas de animais e da produção de queijo. Apesar da alta capacidade de adaptação dos animais a ambientes alagados, resistência para procurar alimento, a nado, em áreas distantes, as últimas enchentes, devido à rapidez da subida da água, provocou a morte da pastagem natural, por não ter havido tempo para a vegetação acompanhar a subida das águas como habitualmente. Ficando submerso por vários dias, o capim acaba apodrecendo e morrendo, fazendo com que os campos pareçam rios.
Esse fator tem obrigado cada vez mais os criadores com acesso a áreas de terra firme, a estabelecerem pequenas áreas de pastagem cultivadas para assegurar alimento para os animais menores durante os picos das cheias. Outros que não têm acesso à terra firme asseguram o alimento dos animais menores com corte de capim; mesmo que essa prática apresente suas limitações, parte dos animais consegue sobreviver.
Além do fator enchente que, por si só, ameaça fortemente a vida de centenas de pequenos criadores em Porto de Moz, pesa o fato de, a partir de 20004, com a criação da Reserva Extrativista Verde para Sempre (Resex), ter sido suspenso o acesso às linhas de financiamento da agricultura familiar. Não se sabe concretamente quem e porque foi suspenso o financiamento para as atividades produtivas na Resex como um todo. Talvez um “gênio maligno”, como diria Descartes, tenha fechado as portas dos bancos para os ribeirinhos e também as possibilidades e condições de enfrentamento aos fenômenos da natureza e às necessidades de um processo contínuo de aprimoramento das práticas de manejo adotadas.
Não obstante, agrava mais ainda a situação, o fato dos órgãos de assistência técnica do estado e do município, assim como os de fomento continuarem apáticos às possibilidades de perda de parte significativa dos rebanhos dos criadores familiares, bem como, à redução drástica da produção de queijo que gera renda para centenas de famílias pelo menos seis meses por ano.
Para os criadores, as saídas são simples, muito claras e já estão estruturadas nas políticas de apoio a produção familiar dos governos federal e estadual: linhas de financiamento público que permitem a reestruturação do sistema, com reforma das morambas; reforma, ampliação e manejo das pastagens cultivadas; assistência técnica para implementação para implementação dessas ações e para a produção de queijo que a vigilância sanitária ameaça, cobra qualidade, mas não apresenta as condições para a regularização dessa atividade no estado Pará. Isso poderia ser feito com a regulamentação da lei de produtos artesanais comestíveis.
Mas, se tudo parece tão fácil de se resolver, porque essa situação está cada vez mais ameaçando a criação de bubalinos nos campos naturais de Porto de Moz? Em se concretizando a redução drástica da criação de animais como já vem ocorrendo, as conseqüências serão barquinhos descendo os rios em direção à cidade para concluir o loteamento do Baixão do Maturu, área de ocupação desordenada da cidade de Porto de Moz. Já a lotérica, nos térreos do Xingu Palace, vai ter seus clientes aumentados na distribuição do Bolsa Família.
O conservador Ministério do Meio Ambiente, o omisso Ministério do Desenvolvimento Agrário e as populações da Amazônia
Até pouco tempo atrás, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) atuava na Amazônia via IBAMA com ações de comando e controle. Recentemente foram criados o Serviço Florestal Brasileiro (SFB) para cuidar das florestas públicas e Instituto Chico Mendes (ICMBio) para cuidar das unidades de conservação, ambos pensados para uma maior aproximação do governo com a sociedade, incluindo as populações tradicionais da Amazônia. O SFB foi criado em 2006 para conceder áreas públicas com floresta para serem exploradas por empresas madeireiras. O custo do SFB é significativamente maior que a arrecadação feita com a concessão de florestas públicas, o que leva a pensar que estamos pagando para conceder áreas públicas para uso privado. Seguindo o governo federal, o Estado do Pará criou o Instituto de Desenvolvimento Florestal do Estado (Ideflor) em 2007 que tem orçamento anual de cerca de seis milhões de reais e ainda não tem resultados a apresentar.
Para não sofrerem ainda mais críticas por terem sido criados apenas para conceder florestas públicas para a exploração privada usando o dinheiro do povo brasileiro, o SFB e o Ideflor também abrigaram a missão de promover o manejo florestal comunitário. E tentam fazer isso com oficinas pontuais de capacitação para um modelo de manejo alheio aos interesses e capacidades das comunidades. As propostas de manejo são ainda inspiradas em pacotes definidos pela legislação, os mesmos que foram fomentados pelo Promanejo com resultados financeiros pífios (veja artigos a respeito nesse blog).
Além de não ter uma proposta funcional de apoio às comunidades, o Serviço Florestal esbarra em outras travas, muitas vezes colocadas por colegas do próprio ministério. Para o caso de comunidades que moram em Reservas Extrativistas, um entrave claro tem sido a atuação do ICMBio, até agora concentrada no comando e controle, exatamente como feito antes pelo IBAMA. Sem dinheiro para elaborar os planos de manejo das unidades e sem uma alocação estratégica e eficiente dos poucos recursos existentes, o Instituto assumiu para si o peso da contradição de suas medidas: não aprova nada nas Resex, nem os planos de manejo florestal apoiados pelo SFB, sem o plano de manejo da unidade, mas também não apresenta alternativas para a elaboração desse plano. Enquanto isso as populações dessas unidades, amargam longos anos de estagnação.
Sem propostas, sem recurso e sem prestígio, os órgãos do MMA, que foram criados para garantir a atenção à sociedade que não era garantida pelo IBAMA, não avançam. Uma alternativa eficiente para quem não tem propostas nem dinheiro sempre foi trabalhar em parcerias. E as comunidades são parceiras fundamentais nesse processo, pois têm propostas e estão sempre dispostas a trabalhar juntas com o governo porque querem melhorar de vida dentro da legalidade. Para começar a parceria, um primeiro passo seria o respeito às populações, às suas organizações e às suas propostas e experiência.
Mas não parece uma contradição que na Amazônia o apoio à produção familiar fique, na prática, nas mãos do MMA, um ministério que cuida do meio ambiente e não nas mãos do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), criado para tal função? A atuação do MDA na Amazônia, além de seus pacotes de créditos em geral pouco acessíveis e pouco adaptados às populações locais, está principalmente restrita ao programa de regularização fundiária - Terra Legal, por exemplo. A função de regularização que originalmente cabia ao INCRA passou para o MDA em xxxx, recebeu críticas significativas e também avançou muito pouco. A política de promoção de produtos da biodiversidade do MDA é tão pontual que nem é conhecida na região.
Enquanto o MMA e o MDA disputam terreno na Amazônia e espaço político na administração federal e não desenvolvem propostas funcionais de apoio ao desenvolvimento local, as populações vão se empobrecendo, em parte pelas travas que o próprio governo impõe a elas. Pelo andar da carruagem, vai sobrar para o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) chegar com suas bolsas para retirar a população da miséria provocada pelo próprio governo.
Dilma, cadê você? As soluções são simples: o MDA tem que assumir seu papel de apoio à produção familiar na Amazônia. Para isso precisa ajustar seus pacotes de crédito e investir em assistência técnica voltada para as atividades já desenvolvidas pela população local. A política de comercialização institucional deve incorporar o apoio mais direto aos agricultores e suas organizações na elaboração das propostas e estruturação das cadeias. O MMA precisa modificar a política de comando e controle para a política de suporte às iniciativas locais com a parceria com as populações locais para a definição dos sistemas de governança. Muitas comunidades têm iniciativas muito interessantes em andamento que, se reconhecidas e apoiadas pelo governo, serão fortalecidas. O MDS que é o novo ministério forte do governo pode começar assumindo seu papel de liderança botando ordem na atuação do MDA e MMA na região.
E o Estado e os Municípios? Governador, prefeitos, cadê vocês? Nesse contexto é fundamental não esquecermos que o Estado do Pará não apresentou política efetiva alguma de apoio à produção familiar. Os municípios, em geral, nem sequer possuem secretaria de agricultura que, quando existem, têm sua atuação limitada a ações pontuais e paliativas sem política estruturante. Estado e municípios estão muito mais próximos da população e têm ainda maiores condições de acertar em suas políticas mas, para acertar, é preciso tentar.
Governança externa na Resex Verde Para Sempre: tudo para o linhão e nada para os moradores
Cláudio Barbosa
Serviço Cerne de Apoio à Produção Familiar na Amazônia – CERNE
A Reserva Extrativista (Resex) Verde para Verde para Sempre, criada em novembro de 2004, no município de Porto de Moz, é a maior do Brasil. Ocupa superfície superior a um milhão e duzentos mil hectares, a população de seu interior está estimada em mais de dez mil habitantes e desenvolve basicamente a agricultura, a pesca, a criação de búfalo na área de várzea e o extrativismo da madeira e outros produtos da floresta como forma de subsistência e geração de renda.
Desde a criação da Resex, as atividades desenvolvidas pelas famílias nunca receberam nenhum tipo de fomento ou apoio por parte do Estado brasileiro. Até o acesso às linhas de financiamento para a agricultura familiar foi vedado! Pesa sob essa postura, o fato da unidade de conservação ainda não ter o Plano de Manejo – previsto na lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC, Art. 18, § 5º). No entanto, recentemente, o Estado brasileiro licenciou a passagem de linhas de transmissão de energia elétrica cortando a Resex em sentido Sul x Norte, até a “Serra da Velha Pobre”, no município de Almeirim.
O fascínio do empreendimento caiu por terra quando membros do Conselho Deliberativo da Unidade realizaram uma visita in loco e fizeram as seguintes constatações: a) os dejetos humanos dos banheiros químicos são descartados em locais desconhecidos; b) os resíduos (lixo) são enterrados nas propriedades dos ribeirinhos sem nenhum cuidado; c) para a instalação da linha de transmissão a floresta sofre corte raso; d) os canais de acesso são abertos com destruição de mata ciliar às margens do Rio Aquiqui; e) a compensação ambiental até agora não existe; f) nem todos os moradores são devidamente indenizados por danos causados às instalações de suas propriedades.
A população local vivencia a situação alheia a tudo: pela falta de acesso à informação coerente dos impactos provocados pelo empreendimento ou por considerar o Estado grande e forte demais para ser questionado em suas decisões. Enquanto o empreendimento é executado com a mesma agilidade da aprovação do licenciamento para sua realização, a população ribeirinha continua na mesma: sem acesso a crédito, acesso legal aos recursos naturais, sem assistência técnica para melhoramento das cadeias produtivas, etc. A vida da população local parece ser de pouca valia para o Estado, por não movimentar grandes somas de dinheiro, pelo menos para aqueles que só conseguem enxergar grandes números. Ou, há dois pesos e duas medidas nessa história: para a população pobre, com pouco acesso a informação e que não dispõe de aparatos técnicos para implementação e desenvolvimento de suas atividades produtivas, aplica-se o rigor da lei. Para a empresa que dispõe de aparatos técnicos, financeiros e jurídico tudo é possível, ainda que a unidade não tenha plano de manejo. Isto é, para o linhão tudo pode, para os moradores nada pode, até que o tal plano de manejo seja elaborado e aprovado!
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