terça-feira, 18 de setembro de 2012

Governança externa na Resex Verde Para Sempre: tudo para o linhão e nada para os moradores

Cláudio Barbosa

Serviço Cerne de Apoio à Produção Familiar na Amazônia – CERNE



A Reserva Extrativista (Resex) Verde para Verde para Sempre, criada em novembro de 2004, no município de Porto de Moz, é a maior do Brasil. Ocupa superfície superior a um milhão e duzentos mil hectares, a população de seu interior está estimada em mais de dez mil habitantes e desenvolve basicamente a agricultura, a pesca, a criação de búfalo na área de várzea e o extrativismo da madeira e outros produtos da floresta como forma de subsistência e geração de renda.



Desde a criação da Resex, as atividades desenvolvidas pelas famílias nunca receberam nenhum tipo de fomento ou apoio por parte do Estado brasileiro. Até o acesso às linhas de financiamento para a agricultura familiar foi vedado! Pesa sob essa postura, o fato da unidade de conservação ainda não ter o Plano de Manejo – previsto na lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC, Art. 18, § 5º). No entanto, recentemente, o Estado brasileiro licenciou a passagem de linhas de transmissão de energia elétrica cortando a Resex em sentido Sul x Norte, até a “Serra da Velha Pobre”, no município de Almeirim.



O fascínio do empreendimento caiu por terra quando membros do Conselho Deliberativo da Unidade realizaram uma visita in loco e fizeram as seguintes constatações: a) os dejetos humanos dos banheiros químicos são descartados em locais desconhecidos; b) os resíduos (lixo) são enterrados nas propriedades dos ribeirinhos sem nenhum cuidado; c) para a instalação da linha de transmissão a floresta sofre corte raso; d) os canais de acesso são abertos com destruição de mata ciliar às margens do Rio Aquiqui; e) a compensação ambiental até agora não existe; f) nem todos os moradores são devidamente indenizados por danos causados às instalações de suas propriedades.

Todas essas constatações foram apresentadas durante a reunião do Conselho no dia 25 do mês de maio de 2012, na cidade de Porto de Moz. O encaminhamento dado pelo presidente do ICMBIO Sr. Roberto Ricardo Vizentin, responsável pela gestão da Resex, foi agendar uma reunião com a ISOLUX, empresa espanhola responsável pelo empreendimento. Seguramente, se fosse um ribeirinho a provocar os impactos, seria preso, multado ou até mesmo expulso da Unidade de Conservação. Ou se as atividades desenvolvidas pelo conjunto de moradores provocassem os mesmo impactos apresentados pelos conselheiros, seguramente a Estado já teria agido de forma implacável. Mas como é uma grande empresa contratada pelo Estado, a coisa é diferente: primeiro agente conversa, depois... sabe-se lá!



A população local vivencia a situação alheia a tudo: pela falta de acesso à informação coerente dos impactos provocados pelo empreendimento ou por considerar o Estado grande e forte demais para ser questionado em suas decisões. Enquanto o empreendimento é executado com a mesma agilidade da aprovação do licenciamento para sua realização, a população ribeirinha continua na mesma: sem acesso a crédito, acesso legal aos recursos naturais, sem assistência técnica para melhoramento das cadeias produtivas, etc. A vida da população local parece ser de pouca valia para o Estado, por não movimentar grandes somas de dinheiro, pelo menos para aqueles que só conseguem enxergar grandes números. Ou, há dois pesos e duas medidas nessa história: para a população pobre, com pouco acesso a informação e que não dispõe de aparatos técnicos para implementação e desenvolvimento de suas atividades produtivas, aplica-se o rigor da lei. Para a empresa que dispõe de aparatos técnicos,  financeiros e jurídico tudo é possível, ainda que a unidade não tenha plano de manejo. Isto é, para o linhão tudo pode, para os moradores nada pode, até que o tal plano de manejo seja elaborado e aprovado!

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